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Quando dezembro vier: o impacto do tempo na Saúde Mental durante o Natal e Ano Novo

Atualizado: 10 de dez.

O final do ano nos coloca diante de um paradoxo: celebramos as festas e os marcos do calendário, mas também sentimos o peso do tempo que passou e das expectativas que nos cercam. Essa experiência, profundamente subjetiva, encontra ressonância na obra de Henri Bergson, cuja filosofia do tempo transcende os aspectos puramente cronológicos para explorar a duração – o tempo vivido e experimentado.

Refletir sobre essas ideias me remete às discussões de Bergson apresentadas pelo saudoso  professor Antônio Gomes Penna, em um curso que fiz com ele, em que destacou a relevância do tempo psicológico na compreensão dos dilemas contemporâneos. Assim como Bergson, Penna discutia o impacto do tempo como uma construção cultural e subjetiva, capaz de moldar nossa saúde mental e nossas vivências emocionais. Durante o Natal e o Ano Novo, esses conceitos tornam-se especialmente significativos, pois as festividades frequentemente intensificam nossas percepções do tempo, suas possibilidades e suas limitações.

O tempo cronológico e o tempo vivido são conceitos diversos. Bergson diferenciava o tempo mecânico, medido por horas e calendários, do tempo vivido, que ele chamou de duração (la durée). Enquanto o tempo cronológico segue um ritmo uniforme, o tempo vivido é fluido, subjetivo, e carregado de emoções. Durante o Natal e o Ano Novo, essa tensão entre o tempo exterior e o interior se intensifica: somos pressionados pelos prazos e rituais, mas internamente navegamos memórias do ano que passou e projeções para o futuro.

Essa dualidade pode gerar ansiedade, especialmente quando o tempo vivido parece acelerar ou fugir ao nosso controle. A experiência de “não ter feito o suficiente” ao longo do ano, por exemplo, não é uma questão objetiva, mas uma percepção enraizada na subjetividade de nossa duração.

Para Bergson o  tempo é uma criação contínua. Em A Evolução Criadora, o autor nos convida a pensar o tempo como um processo de constante criação. Esse olhar é particularmente relevante no contexto das resoluções de Ano Novo, quando muitas pessoas sentem o peso de “começar de novo” ou reinventar suas vidas. A ansiedade surge, em parte, porque somos confrontados pela ideia de que devemos sempre criar algo significativo a partir do novo ciclo que se abre.

Porém, a perspectiva de Bergson também oferece alívio: o tempo não é uma linha rígida, mas um fluxo. Nem tudo precisa ser fechado ou resolvido em dezembro, e cada momento traz sua própria oportunidade de renovação, independente do calendário.

A memória que atualiza o peso do passado é outro aspecto central do pensamento de Bergson que está em Matéria e Memória, onde ele explora como o passado é carregado no presente. Durante o final do ano, as festividades evocam não apenas celebrações atuais, mas também memórias de anos anteriores, tanto agradáveis quanto dolorosas. Essa sobreposição de tempos pode ser fonte de nostalgia, mas também de angústia, especialmente quando as expectativas presentes não correspondem ao que foi idealizado no passado ou trás para o presente perdas e recordações de momentos vividos e perdidos.

 A reflexão que podemos fazer, tomando como base a contribuição de Bergson, é que a ressignificação é a possibilidade que temos de dar o nosso sentido ao tempo. Refletir sobre o final do ano à luz das ideias de Bergson nos ajuda a compreender que o tempo não é um inimigo a ser controlado, mas um fluxo contínuo a ser vivido. Em vez de sucumbir à ansiedade de fechar ciclos ou cumprir expectativas sociais, podemos buscar a conexão com nossa própria duração, abraçando a fluidez do tempo vivido. Afinal, como Bergson nos lembra, o tempo não é o que medimos, mas o que sentimos.


Referências de Obras de Bergson

Ensaio sobre os Dados Imediatos da Consciência. (1889).

Matéria e Memória (1896)

A Evolução Criadora (1907)

Penna, A. G. (2003). O Homem e o Tempo: Estudo sobre Henri Bergson.

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